All or Nothing : Requiem (Zafirah)
- Rhad
- 11 de set. de 2019
- 13 min de leitura

Houve uma visão.
Uma promessa - que nós venceríamos.
Meu deus está morto. Aurene se foi. O calor do espírito de Balthazar agora é apenas um cristal frio e sem vida. Kralkatorrik tirou ela de mim, assim como sua marca (Brand) em breve tomará este mundo.
Eu pensei que finalmente tinha encontrado... alguma coisa. Uma esperança de que o que eu estava segurando era real. Que era bom e puro.
Talvez tenha sido.
Talvez o que eu tive por aquele curto período de tempo entre o meu ponto mais baixo e o fim de todas as coisas, tenha sido tão bom quanto jamais será para mim.
Ou talvez a visão que me mostrou ali ao lado dela durante a batalha final contra o Kralkatorrik fosse uma advertência para eu ficar longe.
Não há consolo no que está por vir. Tudo o que posso fazer é olhar para o passado e carregá-lo comigo onde quer que eu vá.
O rifle nas minhas costas é um símbolo do que veio primeiro.
As primeiras coisas de que me lembro: o brilho do sol, o calor escaldante do deserto e os gritos de minha família.
Existem outras vozes também. Mais profunda, gutural, gritando seus louvores por Palawa Joko como se o lich pudesse ouvir sua devoção por toda a Elona. Minha mãe e meu pai, minha irmã e meu irmão - me mandaram apressadamente porta afora a caminho do vasto deserto com apenas o rifle de minha mãe e uma pequena sacola cheia de munição. Muito pesada para uma criança, mas não o suficiente para o que estava por vir.
Eles me disseram para fugir para Amnoon. Me fizeram prometer que iria sobreviver.
Então eu corri, e seus gritos se tornaram um com os ventos do deserto uivando nas minhas costas.
Fugi para o norte através do Scourgeway, através da Desolation e longe de Joko - o que quer que isso significasse em Elona. Então eu cheguei na Bone Wall. Ninguém podia esgueirar-se pelo portão sem passar por pelo menos três dúzias de Awakened... e estes não eram os camponeses insensatos que perambulavam pelas fazendas e aldeias, forçando o apoio ao lich. Esses não poderiam ser enganados. Não se podia argumentar. Se você tentasse escapar pelo portão com uma desculpa fraca ou documentos mal forjados, você não iria para a prisão.
Você era morto no local.
Eu vi isso acontecer enquanto estava reunindo a coragem para tentar a minha própria sorte. Presenciei um pobre idiota, confuso, insistindo que ele tinha permissão para cruzar com um pequeno grupo de fazendeiros que trabalhavam nas terras além de Elon Riverlands. Os guardas não lhe mostraram paciência, nem piedade. Talvez ele fizesse parte do grupo. Ou talvez não.
Estava claro para mim que eu nunca passaria sozinha. Eu estava presa, vagando pela Desolation.
Eu não tenho certeza de quanto tempo me escondi na Desolation. Eu estava sozinha com quarenta e seis balas restantes na bolsa pesada que minha família colocou em minhas mãos. Algumas caças duraram mais que outras, mas uma vez que eu estivesse sem munição... seria o fim. Eu precisava escapar pelo Portão do Joko.
Havia rock gazelle, claro. E também as sand eels e devourers - embora errar um tiro significava chamar a atenção deles, o que era perigoso. Eu aprendi a não fazer isso.
Um dia particularmente desesperado, até tentei fazer uma refeição com uma ooze sulfurosa. Quanto menos eu falar sobre isso, melhor.
Se algum dos Awakened de Joko me encontrasse, precisaria gastar balas com eles também. Mas isso seria um desperdício. Eu aprendi a me esconder deles.
Quando eu não estava caçando ou tentando traçar meu caminho pelo portão, ficava sozinha com meus pensamentos. Todos eles sobre a família que eu perdi e tudo que havia sido tirado de mim.
Houve a fazenda, as tarefas, a prática de tiro ao alvo pela manhã - a rotina de uma vida simples. Uma vida que não era mais minha.
Claro que eu queria chorar. Claro que queria lamentar. Mas eu não conseguia. Sofrer levaria tempo. Esforço. Eu não podia desperdiçá-los. Eu precisava sobreviver. Eu precisava seguir em frente. Eu precisava chegar a Elon Riverlands, a Crystal Oasis, a Amnoon.
Seriam trinta e um puxões do gatilho antes de eu ter essa chance.
Encontrar meu centro.
Expire.
Não puxe. Aperto levemente o gatilho.
O barulho do disparo. A chama na boca da arma. O coice do rifle. Então, o longo silêncio.
A silhueta da rock gazelle desapareceu do horizonte. Estava feito.
Mas já havia outra silhueta à distância. Awakened, pensei. Olhei através da mira telescópica e vi que era uma Elonian - uma mulher, vestida com as roupas mais bonitas do que qualquer outra que eu já tivesse visto. Ela estava olhando para a gazela, verificando como ela caiu. Ela se virou na minha direção e acenou, sentando-se em um afloramento rochoso como se estivesse esperando por mim.
Eu senti algo. Quanto tempo se passou desde que alguém notou minha presença? Semanas. Mais de um mês pelo menos.
Eu recarreguei o rifle e puxei a alça sobre a minha cabeça para que ele ficasse pendurado ao meu lado. Se ela tentasse tirar minha caça de mim, seria fácil escorregar o rifle em meus braços a postos.
Quando cheguei mais perto, o choque no rosto dela estava claro como o céu estava azul. Ela balançou a cabeça, impressionada e gesticulou para a gazela morta. Moscas já estavam se reunindo.
"Isso foi você?" ela perguntou.
"Sim."
"Qual é o seu nome, garota?"
Eu me lembro de seus movimentos cuidadosos. Lento. Deliberado. Destemido.
Quando me coloquei entre ela e minha caça, ela explicou que a gazela não era minha, que pertencia aos pastores que pagavam ao Hamaseen um bom dinheiro para manter o rebanho vivo. Mas seu tom não era condescendente ou malicioso. Ela parecia... impressionada? Entretida? Nada do que eu esperava.
"Eu não sei o que é o Hamaseen", insisti, "mas não podem ficar com essa aqui. E você também não pode."
Ela sorriu. "Não é de graça", ela disse. Eu me lembro disso, porque eu ouviria muitas vezes depois. Ela me perguntou quem me ensinou a realizar um tiro tão incrível. Eu não lhe dei resposta, exceto pelo meu silêncio, mas ela viu algo em mim - algo que eu não pretendia mostrar.
Ela disse que entendia. Que ela sentia muito.
Eu não conseguia imaginar como essa estranha poderia entender. Senti a fúria e a confusão crescendo em mim até que ela pronunciou as palavras: "O Portão de Joko. Você quer atravessá-lo?"
Não é de graça, claro.
Ela cuidaria de mim. Ela iria me passar pela Bone Wall. Ela me perdoaria por atirar na gazela.
Tudo o que eu precisava fazer era jurar minha pontaria ao Hamaseen.
Zalambur foi rápido em ver meu talento e mais rápido ainda para tirar vantagem disso. Em sua mente ele achava que se ele não o fizesse, alguém faria. Muitos outros membros do Hamaseen pediram minha ajuda, mas Zalambur foi o único a exigir isso.
E Zalambur exigia apenas o melhor.
Quando ele colocou os olhos no rifle velho e gasto que eu carregava, não importava para ele que eu pudesse acertar qualquer coisa que visse no meu alcance. Ele não sabia o que isso significava para mim. Contra meus desejos, ele substituiu o rifle da minha mãe por um novo, com o símbolo do Hamaseen. Seu alcance era duas vezes mais poderoso e capaz de disparar duas vezes mais rápido com metade do coice.
Ele me disse que eu precisaria se eu fosse sua Deadeye.
Eu odiei isso. Mas também adorei. Eu não sei o que aconteceu com o rifle da minha mãe, mas Zalambur insistiu que não importava. Foi uma coisa. Um instrumento. Uma ferramenta a ser usada e depois descartada.
O novo rifle me serviu bem, pois os alvos logo passaram da caça selvagem para os Awakened. Então para os Elonians que eu não conhecia. E finalmente para Elonians que eu conhecia.
Zalambur subiu as fileiras do Hamaseen em cima de uma pilha de meus cartuchos.
Eu fui respeitada entre os Hamaseen, mas com esse respeito veio o medo. Mesmo com todo o poder que Zalambur ofereceu, senti algo faltando. Havia um vazio nisso tudo.
Eu não saberia o que era aquilo até encontrar os Zaishen.
Desde que me lembro, os Seis Deuses não tinham lugar na Elona de Joko. Eu nunca passei muito tempo pensando sobre eles. Zalambur e seus associados Hamaseen não eram exatamente... devotos. E meus pais, até onde eu lembro, não rezavam para nenhum dos Seis.
Então, quando Zalambur me disse que eu estaria protegendo um grupo de sacerdotes Zaishen enquanto eles viajavam pelo Portão de Joko, da Desolation entrando nas Elon Riverlands - o mesmo caminho que eu havia viajado anos antes - eu não dei muita importância. Afinal de contas, Zalambur me enviou para trabalhar com muitas facções de Elona. Ele sempre se considerou como um cuidador do sofrimento daqueles oprimidos sob o calcanhar de Joko. Se houvesse um grupo lá fora capaz de irritar o lich lord, então Zalambur tinha grande satisfação em dar seu apoio a eles.
Mas olhando para esses sacerdotes, me perguntei por que Zalambur estava perdendo seu tempo.
Eu os encontrei em uma pequena caverna cercados por piscinas tóxicas, em algum lugar a leste dos Helcoid Seeps. Havia oito deles, todos vestidos com roupas pesadas, tingidas de laranja e preto. Seu líder, Atsu, tinha algum tipo de adorno de malha decorativo que cobria seu rosto, como um capacete sem propósito defensivo real. Lembro-me de pensar em como aquilo era estúpido.
Para ser honesta, tudo sobre a Ordem dos Zaishen parecia tolo para mim a princípio. Balthazar era um deus do fogo e da guerra. Como você vive sua vida pelo fogo e pela guerra?
Eu era uma agente de morte e destruição dentro do Hamaseen, mas eu não tinha pedido por isso. Não foi uma parte de mim. Depois de anos de serviço, mesmo com o poder e prestígio que Zalambur oferecia, eu ainda não sentia nada além de vazio e o medo dos outros no Hamaseen. Eu nunca poderia ser um deles, não verdadeiramente - porque se eles cruzassem Zalambur, era eu que ele enviaria para acabar com eles. As pessoas me vigiavam de perto. Quem iria querer isso? Quem iria desejar isso?
Eu estava errada. Eu estava errada sobre tudo.
Atsu, o sacerdote, fez algo que eu nunca esqueceria.
Eu acabara de derrubar uma patrulha de Awakened do alto de um desfiladeiro, para garantir a passagem segura para o norte. Atsu pediu para vir comigo até o local onde me posicionei, para "me ver trabalhando". Zalambur não queria que eu enfurecesse esses sacerdotes, então concordei - embora não tenha prestado atenção, me recusando a deixar a presença dele me distrair.
Encontre meu centro.
Expire.
Não puxe. Aperto levemente o gatilho.
O barulho do disparo. A chama na boca da arma. O coice do rifle. Então, o longo silêncio.
Zalambur havia expressado alegria quando viu minha habilidade com um rifle, sabendo como ele poderia usá-la para promover seus próprios fins. A maioria dos outros expressou surpresa ou medo, sabendo que, se fossem marcados, não veriam o fim deles chegando.
Mas Atsu?
Atsu orou.
"Louvado seja Balthazar por este presente."
Ele rezou depois de cada tiro que eu desferi - quatro para derrubar toda a patrulha.
Eu tinha ouvido muitas reações diferentes a minha destreza com um rifle, mas nunca que isso fosse algum presente divino. Eu estava... despreparada para isso. Quando tentei recusar, ele pareceu desapontado. Não que eu estivesse rejeitando sua gratidão, mas isso, em suas próprias palavras: eu não sabia o quão especial eu era. Quão especial eu era para Balthazar.
Então eu senti alguma coisa. Eu não sabia o que era no começo, mas me pareceu estranhamente familiar. Um poder. Uma presença. Eu já sentira isso antes? Sempre esteve lá?
Atsu desembainhou sua adaga e pressionou o punho na palma da minha mão. A insígnia de Zaishen - algo que eu nunca tinha visto antes - foi esculpida na parte de baixo. Para mim, parecia duas asas flamejantes carregando um alvo.
Ele me disse que Balthazar enaltece aqueles que agem.
Balthazar enaltece aqueles que dão um passo à frente, não recuam.
Balthazar enaltece aqueles que não hesitam, tanto na vida como no campo de batalha.
E o mais importante, Balthazar enaltece aqueles que podem tirar uma vida para salvar outras.
Para o Zaishen, nunca é sobre matar, mas matar para garantir segurança para muitos.
Não é sobre fazer guerras, mas vencer guerras.
Não é para matar, mas para proteger.
Atsu me perguntou por que eu estava matando como uma Deadeye para os Hamaseen.
O que eu me tornei? Isso era realmente o que eu queria ser? O que eu deveria ser?
Não. Não, não era.
Pelo menos, pensei que não fosse. Eu não saberia a verdade até que...
Balthazar
Os Zaishen me disseram que eu era um deles, me aceitaram de braços abertos. Eu recebi um presente do próprio Balthazar, disseram eles. E eu acreditei neles. Eu senti a presença de Balthazar naquele dia. Seu poder estava lá, ao meu redor, guiando minha mão. Sempre esteve lá, percebi - uma sombra de um pensamento no fundo da minha mente. Não foi até que Atsu falou comigo naquela caverna bem acima da Desolation que eu finalmente percebi meu verdadeiro chamado.
Então eu saí do Hamaseen. Deixei Zalambur. Deixei tudo.
Mas eu fiquei com o rifle.
Sob a orientação de Atsu, vesti o traje dos Zaishen. Aprendi as palavras que Balthazar nos falou há muito tempo, quando ajudou a humanidade a conquistar Ascalon. Aprendi a ouvir sua voz profundamente dentro de mim e a espalhei para aqueles que não podiam ouvi-lo.
Os Zaishen não me temiam. Os Zaishen não queriam me usar para seus próprios fins. Os Zaishen simplesmente eram. E eu simplesmente fui. Eu era parte deles - parte de algo maior que eu, maior que qualquer pessoa.
Eu fazia parte de uma família novamente.
Eu era uma sacerdotisa de Balthazar.
E então meu deus veio para Tyria.
Eu sabia.
No momento em que o vi, soube que esse era meu deus. Aquele a quem eu tinha prometido os meus serviços. Aquele que me deu meu presente. Aquele que trouxe propósito e significado de volta à minha vida.
Mas algo estava errado. Ele estava diante de mim, alto e imponente, poder irradiando de sua forma física... mas esse poder era diferente do que eu havia sentido todos esses anos antes. Sua voz dissonante da que ouvi dentro de mim.
Ainda assim, eu fui pega de surpresa quando ele nos traiu.
Eu tentei racionalizar. Eu fui até bem sucedida, por um tempo. Passaram-se semanas em que eu convenci meus irmãos e irmãs Zaishen a pegar em armas contra o comandante do Pacto e os Branded.
Eu assisti eles jogarem suas vidas fora.
Eu não pude negar meu deus. Os sussurros que eu senti uma vez dentro de mim cresceram em volume e urgência. O que quer que Balthazar me pedisse, dos Zaishen, nós prontamente lhe demos. Nós sacrificamos todas as nossas vidas para livrar o mundo do Crystal Dragon.
Os Zaishen se juntaram ao exército dos Forged de Balthazar e entraram no Crystal Desert. Nós destruiríamos Kralkatorrik e salvaríamos Tyria de sua marca vil.
Nada poderia nos parar.
Até que o commander conseguiu.
Argon Garrison. Era para ser a minha última resistência.
Eu sabia que nunca mataria o Crystal Dragon, mas tinha que fazer alguma coisa.
Lá, com a espada do meu deus caído, eu terminaria minha vida em meus próprios termos. Eu iria lutar, como Balthazar exigia.
Eu levantei o rifle.
Encontrei meu centro.
Expirei.
Não puxe. Apertei levemente o gatilho.
O barulho do disparo. A chama na boca da arma. O coice do rifle. Então…
O som do metal reverberou pelo pátio de treinamento. Eu vira recipientes como estes em todo o Crystal Desert, cheios de gás paralisante. Os Forged os usavam para subjugar qualquer um que pensasse que poderia nos surpreender das cavernas e ruínas antigas que se espalham pela paisagem. E sempre foi mais fácil interrogar um prisioneiro vivo do que um morto.
Com meu deus e seus Forged derrotados, havia pouca dúvida de que o Pacto estava estocando suas armas, tomando para si.
Eu usaria tudo isso uma última vez. Se alguém tentasse pegar a espada, sentiriam a mordida do meu rifle ou cairiam na névoa sufocante que enchia a guarnição.
Então, houve um som no pátio.
"Se você está aqui para reivindicar sua espada, vire-se!" Eu gritei para o intruso. "Você não tem direito a isso. Saia agora e viva."
Mas espere. Apenas um intruso? Quem seria tolo o suficiente para—
Eu olhei através da minha mira telescópica.
Era...
Era o assassino de deuses.
Instinto. Isso é tudo com o que você pode contar em uma luta. Eu estava com raiva. Eu queria vingança.
E eu disse ao commander que era só o que eu queria. Do Pacto. Dos inimigos de Balthazar. Eles mataram meus irmãos e irmãs, e o deus que me deu propósito.
Mais tarde, muito mais tarde, percebi que isso não era exatamente verdade. Embora eu quisesse vingança, não era contra o commander, nem contra o Pacto, nem contra os inimigos do meu deus.
Eu queria vingança contra o meu próprio deus. Contra Balthazar.
Balthazar matou os Zaishen, meus irmãos e irmãs. Balthazar nos enviou para morrer. Nos enviou para lutar contra o Crystal Dragon. Para dar nossas vidas por uma guerra que só poderia terminar com a destruição de Tyria.
E foi o commander que o matou antes que ele pudesse matar todos nós.
O commander me salvou e o que restou dos Zaishen.
Nós nos lembramos de Balthazar de forma diferente. Ele nos ajudou a descobrir o melhor em nós mesmos. Nos ajudou a encontrar uma família.
Eu não posso deixar quem ele se tornou - aquele que traiu tudo isso - abale minha devoção.
Minha fé não está no próprio deus. Sua carne, tal como foi. Minha fé está no que ele me fez sentir - seu poder, seu potencial. Um potencial que vivia em Aurene.
Até ela morrer.
Eu não sei quanto tempo eu me ajoelhei diante da forma imóvel de Aurene, procurando por algo. Por qualquer coisa.
Tudo o que vi lá foi o meu próprio rosto, refletido de volta nas facetas dos cristais de Kralkatorrik. Comecei a pensar naquelas horas em Argon Garrison. Comecei a pensar sobre o que fiz. As palavras de Atsu voltaram para mim.
Por que você está matando?
Eu deveria ter perguntado isso antes. Eu deveria ter pensado em como Balthazar tratou os Zaishen. Como ele me tratou.
Como ele tratou os Zaishen como suas armas para usar como bem entendesse.
Suas ferramentas. Instrumentos. Coisas a serem usadas, então descartadas.
Mil faces fragmentadas olhavam para mim do cristal. Mil faces com a mesma expressão de dor. Milhares de rostos tentando encontrar uma resposta para a pergunta de Atsu.
Quando eu estava naquela guarnição, eu não sabia.
Eu não estava tentando responder a pergunta. Com a lâmina extinta do meu deus morto ao meu lado, percebi apenas agora que estava tentando manter o propósito que havia sido tirado de mim.
Eu estava perdida, cheia de desespero. Meu deus estava morto. Minha família se tornou inimiga jurada de Elona. Aquele que dera sentido a minha vida agora estava sendo amaldiçoado como um pária que quase condenou o mundo em um ataque de loucura.
Eu passei minha vida contando aos outros as virtudes de Balthazar.
Que Balthazar enaltece aqueles que agem.
Balthazar enaltece aqueles que dão um passo à frente, não recuam.
Que Balthazar enaltece aqueles que não hesitam, tanto na vida como no campo de batalha.
Que Balthazar enaltece aqueles que podem tirar uma vida para salvar outras.
Aquele Balthazar dos Zaishen não tirou vidas, mas as protegeu.
Essas eram as virtudes de Balthazar. As virtudes pelas quais eu vivi. As virtudes que me deram propósito e força. E eu nunca seria capaz de falar delas novamente.
Quando eu estava naquela guarnição, não vi nenhum caminho à frente. Não senti nenhum propósito. Eu queria que tudo acabasse. Eu queria que eles me dessem um fim.
O commander me mostrou outro caminho.
Zalambur e os Hamaseen me usaram como eu usei meu rifle, como uma ferramenta que disparava balas para aumentar o poder de um homem sobre os outros.
Balthazar me usou para atacar o Crystal Dragon, independentemente das consequências para os Zaishen.
Mas o commander? O commander me viu em uma visão. Uma profecia.
Pela primeira vez - pela única vez - meu destino foi firme. Eu não precisava me perguntar se eu havia escolhido o caminho certo ou confiado nas pessoas certas. Eu não precisava saber se minhas balas ou lâminas estavam sendo usadas para o propósito certo.
O destino - não uma pessoa, não um deus - havia me escolhido. Eu não precisava mais me preocupar.
Havia algo mais também. Nestas últimas semanas efêmeras, vi o que a família e a liderança devem ser. Aurene, abençoada com a magia de Balthazar, mas benevolente e carinhosa. Ela ficou na frente daqueles mais fracos que ela. Ela morreu protegendo o commander. Nos protegendo.
Balthazar nunca teria feito isso.
Eu finalmente entendi.
Balthazar se foi.
Aurene se foi.
Tyria está condenada.
Mas eu permaneço. Eu ainda estou de pé, junto com o commander e o Pacto. Junto com os Zaishen.
O destino ditou que eu esteja lá no fim do mundo. Se é para virar pó, então vou falar os princípios de Balthazar até o chão desmoronar sob os meus pés. Eu vou gritar a história de Aurene e seu campeão até que a respiração deixe meus pulmões e eu caia no vazio.
Todas as coisas em que eu coloquei minha fé me deixaram.
Agora, nestes momentos finais, eu ponho fé em mim mesma e no destino.
Nada mais importa.

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